Ao Seu Lado
Um filme que fica no meio
Por Fabricio Duque
Ha um vicioso condicionamento narrativo presente nos filmes gays, que é o uso frequente de estereótipos para traduzir os comportamentos de suas personagens, as categorizando como tipos sociais, mais genéricos e mais preocupados com questões fúteis do culto ao corpo sarado e do “tamanho do pênis”, tópicos que giram quase majoritariamente nas conversas entre eles. Lógico que sempre há exceções a essas regras. Muitas obras cinematográficas optam pela luta social em defesa à diversidade de gênero contra os preconceitos que afetam e violentam a comunidade LGBTQIA+. Outros, entretanto, escolhem fugir desses temas com uma opção diferente, como é o caso de “Ao Seu Lado”, que chega aos cinemas nesta quinta-feira.
O drama britânico, dirigido por Matt Carter (que trabalhou nos efeitos visuais de “Indiana Jones e a Relíquia do Destino”), e, vencedor dos prêmios de Melhor Primeira Narrativa e Melhor Ator no FilmOut San Diego Film Festival 2022, busca mesmo construir um mundo perfeito em todos são aceitos, um naturalizado refúgio gay, em que não é preciso fingir o que realmente são. Aqui, a problematização está na pessoalidade das relações afetivas e intimistas de dois jogadores de rúgbi de um clube pequeno da segunda divisão, que vivem um cotidiano normal: nos treinos, no trabalho, nas cervejas com os amigos no bar, nos reencontros com a família. Pois é, este bem que poderia ser uma evolução narrativa nos filmes gays, se não fosse a necessidade de continuar reverberando pejorativamente os mesmos comportamentos desse meio: a futilidade, a promiscuidade, o egoísmo e o descaso com os sentimentos alheios. Tudo bem, “Ao Seu Lado” pode ser visto como uma micro história que não representa todo o macro, sim, mas mesmo assim, independentemente, de moralismos conservadores (não é o caso deste meu argumento), ao se fazer isso, repercute-se clichês técnicos, estes sim, que doem muito mais nos corações cinéfilos, a presença da câmera lenta, por exemplo, e/ou o roteiro que se preocupa mais com a embalagem expositiva e fetichista dos corpos.
“Ao Seu Lado” mira na naturalidade do homoerotismo, ao filmar a sedução por corpos orgânicos e fortes em ação em um jogo de rúgbi, mas o que realmente atinge é na superficialidade da própria trama e em uma tentativa estética de “filme de festival”, quando cenas de sexo são cortadas abruptamente. É, o espectador fica confuso com o verdadeiro propósito do filme. Quer o romance, quer a impossibilidade do amor, quer a dramaticidade do sofrimento, quer a Discussão de Relacionamento, quer quebrar os paradigmas de uma relação heterossexual dos pais de um dos protagonistas e/ou quer apenas sugerir alguma insinuação? Não se tem tanta certeza sobre nada. “Ao Seu Lado” é um filme que fica no meio. Não está no “time A”, tampouco no “Bs”. Mas há observações importantes.
Podemos observar que é uma obra terapêutica sobre se dar conta das “migalhas”. Ao viciar seu desejo pelos estereótipos criados pelo meio gay (já abordados aqui), como, por exemplo, a objetivação do corpo sem camisa em uma boate, a “conferência” do tamanho do pênis, a máxima tóxica contido no ser humano, que é sempre querer o impossível (homens já comprometidos), nosso protagonista Mark (interpretado por Alexander Lincoln) aceita “o que tem para hoje” e a submissão de estar presente para atender as vontades sexuais do outro, Warren (Alexander King). Assim, a mensagem final de “Ao Seu Lado” é bem realista e pragmática. Não há monogamia. Não há príncipes encantados. E não há finais felizes. Mas no fundo essa praticidade talvez tenha sido positiva. Um artifício do universo para resolver pendências estagnadas e finalmente fazer Mark tomar decisões, que eram apenas ensaios em sua cabeça.
É, escrever sobre “Ao Seu Lado” é criar possibilidades e teorias subjetivas. Talvez o filme seja apenas um filme gay feito para essa específica comunidade gay, até porque não podemos generalizar, visto que as pessoas são diferentes e cada um goste de uma coisa. Há gays do pop, do rock, os que gostam de academia e os que preferem os livros. Fica a pergunta: O que os gays querem, Mário Alberto?
O diretor Matt Carter explica melhor o filme em uma entrevista fornecida à revista digital Pink News, em 14 de abril de 2022: “Há tantas coisas que queríamos explorar, mas já tínhamos muitos personagens e gastamos tempo diferenciando todos eles para fazê-los parecer pessoas reais. É um filme sobre monogamia, adultério e relacionamentos abertos que não são muito explorados em outros filmes gays. É moralmente ambíguo sobre se os personagens estão certos ou errados. Não há um único personagem que não seja irredimível, todos eles têm traumas do passado que os tornam compreensíveis. Muitas pessoas perguntam no final: ‘Devo sentir pena de algum deles?’, porque não é óbvio no filme. O Rugby é este mundo único e antigo com muito patrimônio. E no rugby inclusivo, tentamos manter essa herança. Há algo muito especial nisso e isso afetou minha vida. As pessoas LGBT+ no rugby podem ser transformadoras e espero que este filme faça isso também. O esporte não é algo apenas para o mundo heteronormativo, é também para quebrar estereótipos”.